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O Uso
de uma Estratégia de Operações para Vencer
Gigantes (como na fábula) - Um Caso na
Indústria Cervejeira
Maria
Rita Pontes Assumpção Alves
Professora
DEP/UFSCar ; Doutoranda en Engenharia de
Produção POLI/USP
Caixa
Postal 676 - CEP 13565-905 São Carlos SP; E-mail:
dmrp@power.ufscar.br
Sergio
Azevedo Fonseca
UNESP
- e-mail: fonseca.jau@netsite.com.br
Abstract
O estudo
apresentado neste trabalho pretende contribuir
para a compreensão da nova realidade
empresarial, frente aos cenários globais de
competitividade. Trata-se de uma análise da
evolução e consolidação, num curto espaço de
tempo (15 anos), de uma empresa (Kaiser) na
indústria e no mercado cervejeiro brasileiros,
utilizando - como importante elemento competitivo
- sua capacitaçâo em operações.
Introdução
Os novos cenários
globais de competitividade impõem crescente
importância ao papel a ser desempenhado pela
estratégia de operações no contexto da
estratégia da empresa. Este direcionamento é
justificado pela busca de custos menores,
inovação e melhoria da qualidade - para ter-se
produtos mais competitivos, e agilização de
processos - para aumentar o nível de serviço
aos clientes, sejam internos ou externos à
empresa.
A anterior noção
restritiva da manufatura, fechada em si e
desvinculada das demais funções da empresa, vai
cedendo lugar, progressivamente, à uma noção
mais amplia onde decisões na manufatura
considera e são consideradas em decisões
relacionadas a outras áreas funcionais:
logística, suprimento, gestão de recursos
humanos e, até mesmo, relacionamento com
clientes e fornecedores. As operações deixam de
ser coadjuvantes passivas para a consecução da
estratégia organizacional, assumindo um caráter
de recurso estratégico, ou seja, uma fonte de
energia organizacional por si mesma, além de
ampliar a contribuição a outras funções
organizacionais (Dyer, 1996).
O estudo
apresentado neste trabalho pretende contribuir
para a compreensão dessa nova realidade
empresarial. Trata-se de uma análise da
evolução e consolidação, num curto espaço de
tempo (15 anos), de uma empresa na indústria e
no mercado cervejeiro brasileiros, utilizando -
como importante elemento competitivo - sua
capacitação em operações. A organização
enfocada é a Cervejaria Kaiser que, desde a sua
criação, em 1982, alcançou mercado nacional do
produto, competindo num setor altamente
concentrado e dominado por duas tradicionais
empresas, a Brahma e a Antarctica. A análise foi
baseada em visitas à unidade de Araraquara (SP)
e entrevistas com gerentes de qualidade e de
logística.
Após a
apresentação do referencial teórico, o estudo
inicia com a contextualização da empresa na
indústria cervejeira, apresentando a seguir um
breve histórico da organização e as principais
estratégias adotadas ao longo de sua
trajetória. Na seqüência é analisada uma de
suas mais novas fábricas, a unidade situada em
Araraquara. A contraposição entre diferentes
empresas da indústria cervejeira baseia-se no
que Wheelwright & Hayes (1995) definem como a
trajetória pela qual uma empresa venha a
considerar a estratégia de manufatura como
diferencial competitivo.
A afinidade do
objeto estudado com a fábula pode não ser
completa. Lá, o anão derrota o gigante. Aqui, o
pequeno vai criando forças próprias, unindo-se
também a outros gigantes para desenvolvimento de
competências nucleares (core competencies),
especialmente na área de operações.
2. Suporte Teórico
No passado, os
gerentes de produção ignoravam o uso das
operações como recurso competitivo, não
participando de decisões relativas à parte
estrutural da empresa: localização, tamanho e
escopo de suas plantas, gestão da força de
trabalho e administração de materiais. Os
gerentes de produção eram "vigilantes
de ativos intensivos em capital e não se
posicionavam como arquitetos de sistemas
competitivos". (Skinner, 1995 a).
Atualmente faz
parte das atividades do gerente de produção, o
desenvolvimento e implementação de estratégias
de operações para suas unidades de negócios.
Neste novo contexto, ele deve ocupar-se da
inovação em processos, buscando ajustes no
fluxo de trabalho, tendo em vista uma maior
aderência do fluxo de materiais ao fluxo de
informações (Hayes & Jaikumar, 1995).
Para tal, é
necessário que haja condições para
comunicação entre gerentes e divulgação para
toda a organização (empregados, consumidores,
acionistas, fornecedores, etc...) da missão que
a manufatura desempenha na busca de vantagem
competitiva para a empresa.
Esta divulgação
viza obter de todos, o comprometimento com a
missão declarada. O encorajamento da
comunicação interfuncional entre projeto de
produto e engenheiros de processo, entre P&D,
gestão da qualidade e pessoal de "chão de
fábrica" facilita os processos de
inovação do produto e melhoria no desempenho.
Também as atividades a jusante devem associar-se
às atividades do chão de fábrica. O pessoal da
manufatura deve apoiar o pessoal de vendas, de
serviços de assistência técnica e estar
próximo dos consumidores. Isto é viabilizado se
são oferecidas condições para efetivação
destes compromissos. Os gerentes devem entender
as fraquezas e as forças na estrutura de
manufatura existente. Com este conhecimento
poderá focar o que atacar e traçar plano de
ação específico. A seleção de opções para
ação e definição de metas para melhoria de
desempenho é fruto da reengenharia de processos
críticos, seja de plantas e/ou equipamentos. A
realização de benchmarking com rivais e
entre plantas individuais leva a identificar gaps
de desempenho, que possam vir a ser atacados
(McGrath & Hoole, 1992). Deve-se buscar
rapidez e flexibilidade de atendimento aos
parceiros de negócios e consumidores, suprimento
global e padronização de processos nas
diferentes unidades.
A criação de
linguagem de gerenciamento comum e universal
facilita a coordenação de práticas de trabalho
e planejamento e gestão de sistemas de medição
de desempenho para toda a organização. Sistemas
de comunicação mediados por computador (redes
locais e remotas, groupware, EDI) oferecem
conectividade com vendedores, entre profissionais
de diferentes funções da empresa, entre
instalações distantes, etc.. São ferramentas
facilitadoras para agilizar e aumentar a
acuracidade das informações. Com isso, é
possível racionalizar as operações a nível da
corporação e não individualmente para cada
departamento e/ou planta. Qual seja, a
integração na empresa deve dar-se não apenas
visando a quebra de fronteiras entre as
funções, mas também a existência de um
mercado global, embora segmentado. Assim, o
movimento em direção a integração, implica
necessariamente em um processo de mudança,
filtrando-se por toda a organização e incluindo
inovações em todas as funções da empresa e
entre diferentes unidades da corporação.
Propõe-se, aqui,
para comparar as cervejarias do Brasil, a
adoção do esquema analítico apresentado por
Wheelwright e Hayes(op. cit.). Neste, a
função de operações desempenha diferentes
papéis e oferece distintas contribuições para
a estratégia global da organização. Estes
autores identificaram quatro estágios num continuum
(tabela 1).
Tabela
1: Os quatro estágios de
Wheelwright e Hayes
Características
|
Estágio
1
|
Estágio
2
|
Estágio
3
|
Estágio
4
|
Função
da Manufatura
|
internamente
neutra
|
neutralização
de concorrentes
|
suporte à
estratégia de negócios
|
vista como
vantagem competitiva
|
Mudanças
na estratégia de operações
|
Especialistas
externos
|
Busca
paridade com principais
concorrentes
|
Investimentos
são consistentes com estratégia
de negócios
|
Manufatura
é tratada como recurso
estratégico
|
Gestão
de Recursos Humanos
|
Pouca
importância a política de RH.
|
Resposta à
representação de interesses
trabalhistas.
|
Estratégia
de negócios transmitida ao
pessoal da manufatura
|
Valorização
de Recursos humanos como ativos.
|
Gestão
da Mudança Tecnológica
|
Desenvolvimento
tecnológico adquiridos fora.
Melhorias incrementais de
processos.
|
Investimentos
em novos equipamentos e
instalações, como meio para
ganhar vantagem competitiva.
|
Progresso
tecnológico - com seqüência
cuidadosa de investimentos, como
resposta a mudanças na
estratégia do negócio e na
posição competitiva.
|
Encoraja
desenvolvimento interativo do
negócio, da manufatura e das
demais estratégias funcionais
|
Planejamento
|
Pouco
reativo e flexível
|
Horizonte
de ciclo de negócio para
adquirir competência reativa.
|
Visão de
longo prazo, vinculando
manufatura com outras partes da
organização.
|
Programas
de longo prazo para adquirir
competência pró-ativa
|
Gerência
da Pr
odução
|
Sistemas
internos e detalhados para
monitoramento de desempenho
|
Economias
de escala como principal fonte de
eficiência na manufatura
|
Sistematização
de sistemas e procedimentos.
|
Atividades
estruturais e de infra-estrutura
como fontes de melhoria contínua
e vantagem competitiva
|
|
Cada
estágio caracteriza o papel da manufatura no
desempenho competitivo da empresa: desde um papel
neutro, de simples minimização de impacto
negativo (estágio1), até o outro extremo
(estágio 4), no qual a estratégia competitiva
da organização está grandemente apoiada na
manufatura. Mais do isso, os autores observam
que, num extremo, a produção oferece pequena
contribuição para o sucesso de mercado da
empresa, enquanto, no outro, representa uma
força central de vantagem competitiva. Os
autores chamam atenção para as dificuldades que
as empresas têm para mudar de estágio. Haveria
maior facilidade para um novo negócio iniciar
suas operações em qualquer estágio, do que uma
unidade que já estivesse em operação. Esta
dificuldade é justificada porque as atitudes e
procedimentos estão muito arraigados na cultura
organizacional, sendo necessário grande esforço
para mudanças.
Para ter-se uma
associação estreita entre operações regionais
e a administração corporativa, entre
estratégia de manufatura e estratégia dos
negócios é necessário manter um processo ativo
e efetivo de conhecimento de toda
infraestrutura de produção. Deve-se ter as
plantas estreitamente integradas, embora os
sistemas de produção possam ser distribuidos
geograficamente. Este é o caso da empresa
analisada.
3. O contexto da
indústria cervejeira brasileira
A Indústria e o
mercado cervejeiros brasileiros representavam,
até a década de 80, um dos exemplos mais
típicos de oligopólio homogêneo altamente
concentrado, com duas grandes dominando mais de
80% do mercado nacional. O fortalecimento de
concorrentes - muitos dos quais operando
regionalmente, era respondido com a aquisição
do mesmo pelas grandes cervejarias.
Este padrão de
competitividade na indústria cervejeira do
Brasil vem sendo alterado desde o final da
década de 80. O fator indutor foi a aceleração
da mudança tecnológica, especialmente em
processos. Skinner (1995 b) já destacava a
importância desta mudança, ao observar que a
inovação tecnológica de equipamentos e
processos de produção "são poderosos
motores de mudança", induzindo a
ajustes no fluxo de trabalho, nas habilidades
fundamentais, nos sistemas de informação, de
controle de estoques, de administração de
materiais e de recursos humanos. No caso em foco,
as mudanças mais profundas resultaram na
automatização de processos fabris e gerenciais
(processos administrativos internos e externos à
empresa).
Assim, com a
emergência dos novos paradigmas tecnológicos, a
situação na indústria começa a sofrer as
primeiras mudanças. Pequenas cervejarias -
adotando desde a concepção dos projetos de suas
plantas, novas e homogêneas tecnologias de
processo e estratégias de operação baseadas na
inovação e diversificação de produtos -
ganham competitividade crescente. As duas grandes
do setor cervejeiro nacional adotam mudanças
internas profundas e realizam grandes
investimentos em inovação tecnológica.
Destaca-se, neste sentido, o esforço da Brahma
em ter a informação como arma competitiva
(Mariano & Dias, 1996). Nestas empresas a
existência de plantas com idades díspares,
devido a incorporação das plantas adquiridas,
resulta na coexistência de processos
tecnológicos heterogêneos na organização.
Esta realidade impõe uma maior dificuldade de
coordenação de toda infraestrutura de
produção.
Vale lembrar que
um elemento facilitador das mudanças
tecnológicas foi a parceria que as cervejarias
nacionais estabeleceram com gigantes da
indústria cervejeira internacional: a Antarctica
aliou-se a Anheuser-Busch, fabricante da marca
Budweiser, a Brahma com a Miller Brewing Co.,
dona da segunda marca mais vendida nos EUA,
atrás apenas da "Bud". Esta foi uma
característica comum que a "pequena"
Kaiser teve com as grandes: estabelecimento de
parceria com a Heineken holandesa.
4. Uma empresa inovadora
na indústria cervejeira
A primeira
fábrica de cerveja, é montada em Divinópolis
(MG), com tecnologia assimilada da Heineken
holandesa, na pessoa de um mestre cervejeiro.
Embora a tecnologia seja originária de outro
país, esta transferência é realizada via
parceria.
A principal
inovação introduzida pela Kaiser, no apoio à
comercialização de seus produtos, está contida
na própria estrutura societária da empresa. O
que lhe assegura um potencial de competitividade
capaz de equiparar-se a seus dois concorrentes
mais fortes, é a garantia da presença do
produto nos mais diferentes pontos de
distribuição do país. Isso foi possível desde
os primeiros tempos da empresa (1982) quando, por
iniciativa do fundador, foram convidados, como
sócios, alguns engarrafadores da Coca-Cola no
Brasil. Desta forma, a malha de distribuição do
refrigerante foi aberta à cerveja.
Assim, desde o
início, a Kaiser usa a sua capacitação em
logística como estratégia competitiva para a
abertura de novos mercados e a qualidade como
garantia para fabricação de seu produto.
A escolha dos
parceiros visou a capacitação da Kaiser, não
apenas para desenvolvimento de core competence,
mas pelo que representava para a criação de
valor para a empresa (Bleeke & Ernst, 1995).
A parceria com a Heineken propiciou acesso a
novos produtos e tecnologias com o mínimo de
investimento. A parceria com engarrafadores da
Coca-Cola possibilitou a participação em
mercados geográficos comuns, a aquisição de
habilidades funcionais, mesmo com negócios
centrais complementares (produção e
distribuição). Assim, a parceria da Kaiser com
duas grandes (Heineken para P&D e Coca-Cola
para distribuição) fortalece o seu
posicionamento, usufruindo da sinergia resultante
da consolidação e sobreposição da
competência individual de cada uma (produto e
posição no mercado).
Em sua
trajetória, a Kaiser continua a pautar seu
posicionamento em atividades estruturais e de
infra-estrutura como fontes de melhoria contínua
e vantagem competitiva. A empresa busca localizar
instalações para atendimento dos novos mercados
que emergem no país. Conforme amplia seu
mercado, aumenta sua capacidade de produção
para atendê-lo, agora buscando minimizar custos
logísticos de distribuição. Investe na
aquisição de uma fábrica, em Mogi-Mirim (SP),
a Cervejaria Mogiana, então fabricante da marca
Inglesinha. Constrói outra unidade no Estado do
Rio de Janeiro, município de Queimados, mantendo
o mesmo padrão tecnológico da primeira unidade
estabelecida. Constrói duas outras unidades, em
Jacareí (SP) e em Gravataí (RS). Já na década
de 90, ergue a sexta unidade, em Feira de Santana
(BA). Em 1995, começa a operação de sua
unidade de Araraquara (interior de SP) e em 1996
a operação de sua unidade de Ponta Grossa
(interior do Paraná). Alcança, no início de
1996, significativo crescimento em sua
participação no mercado, chegando a 16,4 % das
vendas nacionais e o primeiro lugar na Grande
São Paulo, com 28,6% do mercado.
4.1. Elementos da
Estratégia de Operações
Propõe-se, neste
estudo, para efeitos analíticos, a
fragmentação da estratégia de operações da
Kaiser em quatro elementos: um correspondente à
política de produtos; o segundo, à logística,
especialmente de distribuição; outro,
corresponde à estratégia de manufatura
propriamente dita, envolvendo processos,
equipamentos e instalações; o último,
referente à adoção das tecnologias de
informação e de telecomunicações.
Produtos
Um aspecto
importante da estratégia de operações da
empresa é a sua preocupação permanente com a
inovação em produto. Prova disso é que em seus
quatorze anos de existência já lançou mais de
quarenta produtos, com média de três
lançamentos por ano. A diferenciação do
produto se dá pela receita e apresentação
(embalagem e conteúdo) e busca por distintos
segmentos de mercado.
Apoio aos canais de
distribuição
A aliança
societária com engarrafadores da Coca-Cola
disponibilizou à Kaiser um mecanismo inovador na
estrutura de distribuição de cervejas: a
emissão e transmissão automática de pedidos.
Permite-se, assim, uma maior rapidez e agilidade
na programação da produção e no próprio
atendimento aos clientes (pontos de venda).
O exemplo dos
resultados alcançados na Grande São é
ilustrativo da importância que assume a forma
como está estruturada a distribuição. Nessa
região a distribuidora da Kaiser é a empresa
Spal Pananco Indústria Brasileira de Bebidas
S/A, responsável por 25% do total nacional de
vendas da Coca-Cola. Seus vendedores saem com um
micro-terminal, coletor de dados, onde registram
os pedidos, após a verificação do volume de
estoques existente no cliente, do cadastro e seu
histórico de pedidos. Com base nessas
informações, pode sugerir ao cliente a
quantidade a ser pedida. Os pedidos coletados
durante o horário comercial são transmitidos
eletronicamente para uma central de processamento
da distribuidora. Esses dados municiam a
programação das entregas, feita por
roteirizador (software que traça as rotas
de entrega), de forma a otimizar o volume de
carga por tamanho de veículo e necessidade dos
clientes.
Outra iniciativa
da Kaiser é de automação das forças de vendas
(SFA - Sales Force Automation), aplicado
aos representantes comerciais das unidades. Estes
representantes alimentam o sistema de
informações de mercado, via conexão
eletrônica, às redes de telecomunicação da
empresa (vide abaixo). Esta conexão, via notebooks,
substitui o telefone e o fax como canais de
comunicação. Isto confere maior autonomia e
dinamicidade no exercício de suas atividades (empowerment),
quebrando a centralização hoje existente nos
gerentes comerciais das unidades. Com esta
mudança cada representante comercial passa a ser
responsável pelo gerenciamento de seu desempenho
nas vendas da região sob sua alçada. Há
centralização das informações e
descentralização das responsabilidades. Os
dados sobre o desempenho de vendas e o movimento
comercial de cada distribuidor é desagregado em
nível detalhado e on-line. Os resultados
desta análise tem influência direta no
orçamento que cabe a cada representante. Isto
leva a uma maior transparência na análise de
desempenho, facilitando o apontamento de
responsabilidades individuais e agilizando o
encaminhamento de soluções frente a
distorções que venham a ser detectadas. Como
consequência espera-se um enxugamento no número
de representantes comerciais. Aos que permanecem,
exigir-se-á melhor qualificação e
responsabilidade por uma região mais ampla e/ou
com maior densidade de vendas, com consequente
aumento da produtividade individual.
Além das
inovações na estrutura de distribuição, a
empresa busca inovar nos pontos de venda a
varejo. Exemplo típico é o caso do
desenvolvimento, pelo Centro de Tecnologia da
Kaiser, de máquinas automáticas para venda de
cervejas.
Processos
Para as primeiras
unidades, o vetor transmissor da tecnologia foi
um cervejeiro com experiência na montagem de
fábricas para a cervejaria holandesa. O processo
de transferência do conhecimento tecnológico
passou a ser institucional a partir da
associação da Heineken à Kaiser (possui, hoje,
14% das ações). Essa dependência externa em
tecnologias de processo e equipamentos é
própria do estágio 1 (v.tab.1).
Um dos mecanismos
encontrados pela Kaiser para reduzir essa
dependência é seu processo de aprendizado
organizacional: as inovações introduzidas em
uma planta são, à medida da compatibilidade
tecnológica, incorporadas às plantas
anteriores. Serve também, para melhoria nos
projetos de futuras instalações A unidade de
Araraquara é tida pela direção da Kaiser como
uma fábrica modelo, piloto, onde as tecnologias
e sistemas inovadores são experimentados e
testados, para posterior difusão para as outras
unidades. O benchmarking aplicado às
velhas instalações garante, não só uma
melhoria nos processos operacionais, como ainda
uma progressiva homogeneidade tecnológica e,
fundamentalmente, uma melhor capacitação de
seus recursos humanos. Esta última preocupação
é própria de empresas no processo de
transição do estágio 3 ao 4.
Tecnologias de
Informação e Telecomunicação
A Kaiser faz das
Tecnologias de Informação e de
Telecomunicações elementos centrais em suas
estratégias de operações e de negócios,
aumentando a confiabilidade e agilização de
processos. Conta, para isso, com redes de
transmissão e troca de informações, buscando a
automatização nos procedimentos administrativos
nas suas unidades, a integração e coordenação
entre as unidades e com a matriz e a integração
e rápida comunicação com os distribuidores e
clientes. Ao implantar suas redes, a empresa
está caminhando em direção à estrutura da
"fábrica virtual", conforme descrita
por Upton e McAfee (1996). Dispõe de redes
locais e remotas (LAN - Local Area
Networks e WAN - Wide Area Network)
integrando cada uma de suas sete unidades com a
matriz e está conectada à Rede mundial, com home
page para divulgação de sua marca e contato
com consumidores.
Suas redes de
telecomunicações disponibilizam informações
referentes às atividades e operações de cada
unidade: níveis de estoques de insumos,
programação de produção, volumes em
produção, entregas programadas, desempenho nas
vendas e outras. A rede remota (WAN) é
gerenciada por um groupware (aplicativo
para trabalho em grupo), o GroupWise 4.1a
(implantada em julho de 1996). Esta ferramenta
juntamente com o software Workflow
permitem comunicação rápida entre as unidades
e a matriz, com a eliminação da circulação
física de documentos, tais como formulários,
pedidos, faturas e outros. Também a guarda de
papéis é eliminada pelo arquivamento
eletrônico. A organização e sistematização
das informações oriundas de diferentes fontes
são feitas por um Data Warehouse. Este é
um sistema inteligente de busca, recuperação e
tratamento de informações para suporte às
decisões de nível gerencial (Alves, 1997).
Agregando dados das diferentes unidades de
produção e dos diferentes mercados, este
sistema disponibiliza indicadores de desempenho
da organização, agilizando o processo de
decisão a nível estratégico e operacional.
Outra ação
inovadora na indústria foi a implantação da
linha 800, criada para funcionar como canal de
comunicação com o cliente final.
Pelas
informações obtidas, a Kaiser encontra-se num
estágio bastante avançado de integração na
cadeia de suprimento de seus produtos,
particularmente à jusante. No que diz respeito,
contudo, à interligação com seus parceiros
externos à montante - fornecedores, o processo
é caracterizado apenas por suprimento global a
todas as unidades, principalmente de insumos
importados. Ainda não existem ações concretas
para a integração em rede.
4.2. A Unidade de
Araraquara
De acordo com
informações fornecidas pela própria empresa,
esta unidade é considerada uma das mais modernas
cervejarias do mundo, operando com equipamentos e
soluções tecnológicas de última geração. Da
recepção da matéria prima até a expedição
do produto já engradado, todas as etapas são
controladas por computadores. Até final de 1996
era a única cervejaria totalmente informatizada
do Brasil.
As operações da
unidade dividem-se em cinco processos, descritos
na tabela 2.
Tabela
2: Operações na Kaiser - Unidade de Araraquara
A primeira
corresponde à preparação do
processo produtivo. Compreende a
captação, análise e eventual
correção das características
físico-químicas da água; a
recepção e análise amostral
das matérias primas - malte,
lúpulo e cereais não maltados;
o controle dos estoques das
matérias primas. O controle
computadorizado está presente em
todas as atividades nesta etapa; |
A segunda compreende
o processo produtivo em si.
Envolve o beneficiamento do
malte, a preparação das
receitas (mosto), a
fermentação, a maturação e a
filtragem. O processo e seu
controle são totalmente
automatizados. Apenas 9
funcionários, distribuídos em
três turnos de trabalho e todos
com segundo grau completo,
conduzem e controlam
integralmente o processo; |
A terceira, uma
etapa auxiliar, também
totalmente computadorizada, dá
suporte ao funcionamento dos
equipamentos da unidade e permite
o controle do chamado sistema de
utilidades, ou seja, apoio ao
processo produtivo: instalações
para geração de vapor, ar
comprimido, gás carbônico e
resfriamento; |
A quarta etapa é a
do engarrafamento. Envolve a
lavagem e esterilização das
garrafas, o envasamento, o
arrolhamento, a rotulagem e o
acondicionamento para a
expedição. O processo é
controlado por sensores
inteligentes, capazes de detectar
eventuais irregularidades em
diferentes pontos da linha,
quando são emitidos sinais para
adoção de medidas saneadoras; |
Finalmente a última
etapa é a da expedição, quando
são preparados os lotes para a
distribuição. Os lotes são
despachados imediatamente ao
término de seu preparo. |
|
A
incorporação dessas tecnologias exigiu a
adoção de uma política de recursos humanos,
pela qual cerca de 90% do quadro de pessoal da
unidade possui, no mínimo, curso técnico de
segundo grau. Mais do que isso, é parte da
filosofia de trabalho da unidade a formação de
operadores multifuncionais, habilitados à
operação e manutenção dos equipamentos, assim
como para o controle de qualidade nos processos.
5. Conclusão
O sugerido é que
as grandes cervejarias brasileiras estariam nos
primeiros estágios do continuum proposto
por Wheelwright e Hayes (tab 1). Neste caso, a
resistência às mudanças seriam maiores, dado
seu patrimônio tecnológico e instalações
terem sido formados por pacotes adquiridos e as
atitudes gerenciais serem tipicamente top-down.
Admite-se que unidades de grandes cervejarias
brasileiras possam estar em estágios mais
avançados, contribuindo para
"alavancar" a organização como um
todo.
No outro extremo,
mais próximas aos estágios 3 e 4, estariam as
cervejarias mais novas, como a Kaiser. A
atualização tecnológica das plantas já
existentes é feita com menor ruptura de
estruturas. As mudanças são progressivas e
encontram menor resistência, seja nos níveis
diretivos e gerenciais, como nos operacionais.
Atribui-se maior importância à estratégia das
operações.
Sua política de
difusão de inovação entre as diferentes
unidades, aliada à preocupação permanente com
a capacitação dos recursos humanos e com a
crescente adoção das Tecnologias de
Informação, revela uma postura própria de uma
organização do conhecimento (learning
organization). Esta atitude dá suporte ao
desenvolvimento interativo do negócio, da
programação conjunta de operações pelas
diferentes plantas, para apoio à execução dos
planos de ação definidos pela estratégia de
marketing a nível nacional.
Essas
características reforçam a proposição, já
formulada anteriormente, de que a Kaiser é uma
empresa cuja estratégia de operações está
focada na busca contínua de uma aproximação ao
estágio 4 de Wheelwright e Hayes. É o que se
procurou demonstrar.
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